A Cantoterapia é a musicoterapia pela voz que ressoa em cada pessoa como única e essencial. A voz é o portal da nossa alma que canta e o corpo é o seu instrumento, sendo a respiração a grande integradora. Vivenciamos essa integração pela transformação do ar em som, que nos dá a sensação de vida. Tudo que perturba como tendência doentia no corpo pode ser corrigido e harmonizado pelo canto.
O canto ativa a coragem para o mundo e a experiência de si mesmo. Por isso, a cantoterapia é indicada para bloqueios e transtornos emocionais como traumas, estresse, síndrome do pânico e depressão. As doenças respiratórias como asma e bronquite, os distúrbios nas cordas vocais (nódulos- calos- fendas e rouquidão), gagueira e disfonias, perda vocal e bruxismo, distúrbios auditivos e início de surdez se beneficiam especialmente com a cantoterapia. Sendo extremamente energética, revitalizante e ordenadora, a cantoterapia ajuda na recuperação de doenças graves como anorexia e bulimia e recuperação de pacientes de câncer, tireoidites e doenças autoimunes.
Foi iniciada e fundamentada pela cantora Valborg Werbeck-Svardström (1879-1972), que nasceu e cresceu no campo, em zona rural, perto de Estocolmo. Era uma menina que mostrava dons e que encantava as pessoas com o seu canto.
Aos 25 anos teve a oportunidade de realizar uma turnê pela Alemanha, onde cantou para o então famoso tenor Heinrich Knote, confiando–lhe as suas preocupações com o desagrado que sentia ao cantar. Ao ouvi-la, ele lhe disse que ela cantava por uma técnica não adequada para a sua voz, e que deveria buscar uma técnica mais leve. Nessa mesma viagem conheceu Louis Werbeck, escritor, poeta e violinista, ligado ao movimento antroposófico, que se tornou seu empresário e com quem se casou em 1906, passando a frequentar as reuniões de estudos da Antroposofia.
Em 1910, aos 31 anos, perdeu a voz por uma paralisia nas pregas vocais e deixou de cantar por algum tempo. O episódio da doença a motivou a pesquisar a sua voz infanto-juvenil, lembrando-se do encontro com Heinrich Knote seis anos antes. Tentando resgatar uma sonoridade da sua voz de criança, ela chegou ao som do NG, que exercitou durante um ano. Por meio desse som recuperou a voz em toda a sua extensão e retornando à sua carreira de cantora lírica, em parte para não se isolar do mundo, em parte para provar a eficácia da sua pesquisa e do seu estudo. Com o processo terapêutico fez um trabalho simultâneo ao canto lírico, ao qual deu continuidade, visando adquirir e manter um equilíbrio vocal. Este processo terapêutico, porém, se tornou tão importante para ela, que, aos 56 anos, largou a carreira artística na ópera, para dedicar-se exclusivamente à nova maneira de cantar, que recebeu o nome “O Desvendar da Voz”.
Em 1911 pediu uma audiência com Rudolf Steiner para se aconselhar a respeito da sua meditação. A partir daí, começaram a conversar sobre a pesquisa que ela estava. Passaram a se encontrar regularmente, ela levando perguntas e pesquisas para Rudolf Steiner, ele aconselhando com suas sugestões, dando um respaldo para essa pesquisa. Nesta época, Valborg já atendia casos difíceis. Ela os relatava para Rudolf Steiner e ele então dizia “como” e “onde” podia atuar. Essa parceria durou até 1923.
Em 1924, Rudolf Steiner oficializa a Escola Desvendar da Voz como um caminho artístico e terapêutico, dentro da Antroposofia. Inicia-se todo um trabalho para a formação de um “Caminho Interior”. Devido à guerra, somente 14 anos mais tarde, em 1938, o seu livro pôde ser lançado: “Die Schule der Stimmenthüllung”, um livro que dá as bases filosóficas, pedagógicas e terapêuticas do canto.
A Escola do Desvendar da Voz indica três caminhos: o caminho artístico, o caminho pedagógico e o caminho terapêutico, que hoje se unem em torno do mesmo ideal, As dificuldades, que as pessoas percebem com a voz e as dificuldades na vida e na saúde, levaram ao desenvolvimento simultâneo dos trabalhos pedagógico, terapêutico e artístico.
O objetivo da Escola Desvendar da Voz é tirar o canto do elitismo, objetivar, espiritualizar e humanizar a voz, que normalmente é vista do ângulo pessoal, de um talento sobrenatural ou de uma “bossa”. Não é só um canto para a elite, para pessoas talentosas. Todas as pessoas podem, por meio do canto, descobrir a sua verdadeira essência, que se encontra na voz.
O que esconde esta essência são as vivências e experiências na vida desde a infância aliados à constituição física do indivíduo. São os véus, que se colocam sobre a voz e que a impedem de se manifestar. Estes véus podem ser físicos e emocionais.
Deste modo, o objetivo da escola não é formar a voz, mas sim tirar os véus que a encobrem. A função vocal tem uma função maior, pois a voz se relaciona com o Ser Humano como um todo e tem uma vitalidade que precisa ser resgatada. O ser humano necessita de constante vivificação. Essa vida pode ser resgatada pelo canto, pela voz. Pode-se melhorar a qualidade vital nas pessoas, evitando-se o desgaste e o stress. Por meio dos exercícios, podemos vivenciar uma melhora na saúde corporal e um encontro íntimo consigo mesmo.
O resgate vital primeiramente é feito através da respiração. Trata-se de um trabalho respiratório fundamentado na evolução espiritual, tendo a música como protetora: “No canto, quando nós nos ligamos à música, ligamo-nos com a Corrente Sonora Primordial e estamos dentro da corrente respiratória e isto nos leva á nossa essência.”
Esta CORRENTE SONORA PRIMORDIAL contém todos os tons e toda a música, assim como também o ser humano guarda todos os tons em sua memória. A partir do que fazemos cantando, ocorre o resgate dos tons e abre-se um cálice, de onde jorram “gotas”, que têm formas diferentes, que suas expressões e características individuais. Cada tom é um indivíduo desta Corrente Sonora Primordial.
Entramos em contato com a Corrente Sonora Primordial através das três atividades anímicas: PENSAR, SENTIR E QUERER. Por meio do ritmo respiratório o canto passa por três fases.
Temos que entrar num ritmo respiratório. O gesto da admiração guia a nossa inspiração. O impulso expressivo guia a nossa expiração. Precisamos encontrar harmonia entre dois gestos: inalar a voz e projetar a voz. O diafragma e o líquor cérebro espinhal participam ativamente desse processo. A voz então pode se conectar com a Corrente Sonora. Nesse caminho se reconhece diferentes etapas. Quando a voz se revela espiritualmente, esta Corrente Sonora Primordial alcança o seu objetivo e “esquecemos” a respiração.
É primeiro através do PENSAR, que alcançamos este objetivo. E como se pode verificar o pensar dentro do canto para conseguir direcionar o tom? Cada fonema é uma individualidade. Cada tom é um indivíduo. Torna-se assim um objetivo de direcionamento do som. Para colocar no lugar em que ele deveria ficar, precisamos da nossa capacidade de concentração e de imaginação (pensamento e imagem) e precisamos da ajuda do fluxo aéreo.
Trabalhamos com o elemento SENTIR na colocação da voz, na percepção da temperatura, da qualidade do som que cantamos e da dinâmica: isto tem a ver com o sentir. Sentimos que “estouram os tímpanos” e sentimos como vibração total. As vogais são manifestações da alma (vibrações anímicas, de dentro para fora), que expressam o que o homem sente. As consoantes são manifestações cósmicas formativas, as duas juntas atuam de maneira mais intensa: forma, fluxo e expressão. A natureza absorve as consoantes (de fora para dentro).
Este é o próprio campo da ressonância. Nele experimentamos a dinâmica, de como podemos crescer e ampliar o som. Sentimos que temos talento natural, mas se esse talento (o canto) não recebe um direcionamento, corre o risco de se perder. Nessa fase usamos muito os músculos e ampliamos a respiração.
O QUERER atua fortemente, mas no sentido de um controle e calma total, onde só a música deve se manifestar. Para conseguir este momento é necessário exercitar-se com “NG-NG-NG”: esse som é pontual como um momento de meditação. De um ponto acima da cabeça (central) que é o ponto de ligação com a Corrente Sonora Primordial, esse tom vai jorrar diretamente no Plexo Solar. Normalmente só se alcança a 3ª Fase devidamente, após ter trabalhado muito com as Fases 1 e 2.
“Cantar é um ato espiritual que se expressa pelo campo emocional, o corpo físico é o seu instrumento para se tornar audível”. Meca Vargas – cantoterapeuta pela Escola Desvendar da Voz, SP – Brasil.